Aposentadoria é sinônimo de melhoria de vida?

O que vem à sua cabeça quando pensa em aposentadoria? Se você visualizou uma vida mais saudável e tranquila, talvez seja a hora de quebrar um mito. O projeto Share (Survey of Health, Ageing and Retirement in Europe – Pesquisa de Saúde, Envelhecimento e Aposentadoria na Europa, em tradução livre) chega à sétima edição e mostra que essa ideia nem sempre é válida.

Os resultados indicam que, ao contrário da crença popular, os trabalhadores mais velhos não são menos produtivos. “Vimos que a produtividade se mantém bastante estável, talvez até com um leve aumento à medida que se envelhece”, disse Axel Börsch-Supan. pesquisador do Instituto Max Planck para Lei e Política Social em matéria da Folha de São Paulo. O estudo apontou que, apesar de registrarem mais falhas com o aumento da idade – principalmente em setores industriais –, elas são menos graves do que as cometidas pelos jovens.

Outro engano apontado pela pesquisa diz respeito ao mito de que manter pessoas mais velhas nas empresas tira o emprego dos jovens. Segundo o pesquisador, a aposentadoria precoce custa mais caro aos cofres públicos.

Isso sem falar no impacto à saúde. Börsch-Supan acredita que, em partes, o aposentado se torna mais saudável, mas não é uma regra. “Porque não condiz com acadêmicos, por exemplo, mas faz sentido para quem sempre fez trabalhos pesados”, disse. As capacidades cognitivas são as que mais sofrem, com uma perda significativa da memória entre os franceses – que se aposentam mais cedo – em comparação com Suécia e Estados Unidos, por exemplo. “Se você apenas fica em casa vendo TV, e aqui estou falando de um extremo, sua capacidade cognitiva decai. Essa é uma razão pela qual é preciso pensar duas vezes antes de dizer que aposentadoria melhora a saúde. É mais complicado do que isso”, disse Börsch-Supan.

A pesquisa

Esta é a sétima edição da pesquisa, que, desde 2004, já realizou 350 mil entrevistas em profundidade, com 130 mil pessoas, em 39 línguas diferentes. Consiste em longos questionários, feitos sempre com as mesmas pessoas, para entender como fatores como saúde, renda e trabalho são afetados pelo aumento do número de indivíduos com mais de 65 anos.

“O envelhecimento da população é o desafio do século 21. Em 2050, haverá muito mais pessoas velhas do que jovens na Europa. Isso cria todo tipo de problema. Será caro pagar as aposentadorias e os jovens de hoje é que vão pagar por isso, querendo ou não”, disse Börsch-Supan. O pesquisador destaca que, por isso, precisa observar os indivíduos ao longo da vida, de modo a comparar várias décadas de mudança. Ele acredita que não é possível comparar o jovem de hoje com o idoso também de hoje, pois os momentos históricos que eles viveram é diferente.

Além de indicadores socioeconômicos, como a rede familiar e testes cognitivos, são acompanhados os dados de produtividade. Essa é uma informação difícil de ser obtida e, para consegui-la, os pesquisadores recorrem às empresas dos entrevistados. No total, 5 milhões de observações já foram analisadas.

Cenário brasileiro

Há uma mudança significativa no cenário da população brasileira. Até 2050, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística estima que a população com mais de 60 anos vai triplicar, chegando a 29,3%. “Não é um crescimento tão rápido e forte como na Europa, mas também afetará o país num grau significante, mais do que outros países, como o México”, disse Börsch-Supan.

Um dos principais impactos será sentido no custo da previdência, mas esse é um problema que afetará, em diferentes graus, outros países da América Latina e Caribe. “O que se gasta em aposentadoria está se tornando um problema importante para os governos, para as finanças públicas, de forma que há que se chegar, de alguma maneira, a uma solução”, disse Antonio Carlos Campino, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) em entrevista à Agência Fapesp.

Em 2015, por exemplo, o Brasil gastou 3,8 vezes mais com os idosos do que gastou com os jovens – R$ 19.705 per capita contra R$ 5.136 per capita. “A consolidação do ensino primário público não ocorreu antes que a maioria da população mais velha começasse a receber aposentadoria. Com isso, o desenvolvimento econômico baseado em substituição de importações aumentou a importância do sistema de seguridade social, ao mesmo tempo em que negligenciou investimentos em educação e saúde”, disse Campino.

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